segunda-feira, 19 de julho de 2010

O primeiro café

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É simpático, o empregado da pastelaria onde tomo habitualmente o primeiro café da manhã. Simples, veio para Lisboa ainda uma criança, trabalhar como marçano numa daquelas antigas mercearias que a cidade já não tem.
Quando comecei a frequentar o estabelecimento, dirigia-me um respeitoso “Muito bom dia!”, quase sempre em alto tom, acompanhado de um sorriso, próprio de quem encara a vida com redobrado optimismo. Duvido que lhe respondesse com a mesma alegria, porque de manhã, antes do café, estou perto do intratável. Mas respondia, claro, educadamente.
Passaram uns tempos, e um dia o nosso amigo saudou-me assim:
“Bom dia, jovem, tá bom?!”
Surpreendido…consegui responder:
“Bom dia, jovem já fui…mas bom estou”.
Ficou a olhar para mim, com o sorriso a desvanecer-se.
O “jovem” desapareceu da matinal saudação, até que um dia surgiu uma outra:
“Então patrão, a bica do costume, não é verdade?”
Menos surpreendido…respondi:
“A bica do costume, é mesmo verdade, e patrão não sou de ninguém, talvez nem mesmo de mim próprio!”
Desta vez, o sorriso desapareceu completamente.
E desde então, voltou o inicial “Muito bom dia!”, com o qual parece dar-se bem.
Eu, pelo menos, dou-me.

2 comentários:

  1. hummm pois eu correspondo à, quando não entabulo eu mesma, conversa nos lugares costumeiros ou nos de ocasião. Não no café, onde propriamente não vou, mas no mini, super ou até hipermercado. E sim, no hipermercado! O hiper que quase todos classificam de impessoal. Conheço os funcionários que me fazem um trejeito de rosto quando o peixe não é do dia (ou me dizem "a sua encomenda não veio hoje, talvez amanhã", e logo sei que, embora sendo terça o peixe é de sábado), e me abrem as melancias para verificar se aquela é mesmo doce. Gosto também, quando se proporciona, de entreter em conversa com os taxistas, pois estes são um manancial de pequenos contos do quotidiano, histórias da vida real.
    Na mercearia local, a Norte, recebo até presentinho no Natal... garrafa de vinho do Porto ou saqueta de frutos secos.
    E no pequeno super, a Sul, trazem-me os sacos ao carro, por muito que eu insista na recusa nos dias em ques estes vão leves. Bem como o rapaz do talho, quando me vê, nos tempos de estio, em traje de praia, se fica a lamentar de saber o sol lá fora e ele, ao fresco (pois que os balcões frigoríficos refrigeram), mas ansioso de calor e mar.
    E falta ainda o senhor dos toldos de praia, com quem muito aprendi de marés, bom tempo, época dos polvos e dos barcos à noite de lanterna na procura da lula. Coisas que eu não saberia se não me perdesse nestes diálogos.
    Na verdade, gosto de pessoas, de conhecer os seus mundos pessoais, reais, pulsantes, de descobrir o que cada uma tem para me ofertar, e aprender.
    A Norte, porque é um outro estar sempre para mim a desvendar; a Sul, porque Lisboa é um misto de gentes de aldeias que fazem esta cidade aldeia grande, e, na linha, porque as nacionalidades se cruzam. O rapazito do talho é russo, a senhora da padaria croata (aprendi com ela as festividades natalícias do seu canto natal), o cabeleireiro é brasileiro e canta mornas enquanto me estica e enrola o cabelo, ao que eu sorrio e lhe puxo conversa das saudades do seu mato (pois que ele veio de perto da Amazónia).
    Só não me falem em viagem, que aí, de comboio ou camioneta, gosto de me embrulhar na paisagem, deambular nas minhas experiências e ponderações, escrever o que me ocorrer, ou deixar que o embalo do asfalto ou dos carris me adormeça.

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  2. Esse empregado não merecia outra resposta.

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